Crônica publicada originalmente no site "A Crônica do Dia" em 12/05/2008)
Noites de insônia, programinha de contagem regressiva na tela do computador, dúvida, receio, indecisão. É a TPM, que — acredite — também atinge os homens. Há semanas eu venho sofrendo de Tensão Pré-Montreal.
Quem me conhece sabe o quanto eu sou apegado à minha cidade. Nunca me imaginei morando noutro lugar que não o Recife. E sempre disse isso pra todo mundo. Viver longe do Carnaval, do frevo, do maracatu, dos caboclinhos e do manguebit? Deixar pra lá o forró (o de verdade, por favor) e o São João? E o rio Capibaribe? E a praias de Boa Viagem, Porto de Galinhas, Serrambi? Ficar sem comer aquele siri-mole ao alho e óleo do Bar do Cabo, os caranguejos ao molho de coco do Guaiamum Gigante, os ensopadinhos de aratu e as agulhinhas fritas de Porto de Galinhas? Nem pensar. Passar sem os jogos do meu Náutico, logo agora que ele está na Série A pelo segundo ano consecutivo, depois de doze longos anos afastado? De jeito nenhum. Pior que tudo isso, só viver longe do meu pai e de minhas irmãs e sobrinhos. Não, de forma alguma, nem em pensamento!
Acontece que as coisas mudam. Há um ano realizei o meu sonho de ser pai, e agora tenho que pensar também no futuro do meu filho. Não posso mais pensar apenas no que é bom pra mim, mas devo pensar principalmente no que é melhor pra ele. E é por isso que em poucas semanas estarei partindo pra morar no Canadá, como imigrante. A cidade que escolhi? Montreal, aquela das Olimpíadas de 1976, que eu nunca pensei sequer em visitar.
Não vou em busca de dinheiro. Vou em busca de um lugar melhor para viver, onde possa ter um mínimo de segurança e onde as pessoas saibam o significado da palavra respeito — coisas difíceis de se encontrar no nosso país ultimamente. Pelo menos na minha cidade. E isso tem um preço: me afastar das coisas e das pessoas que gosto. Preço muito, muito alto.
Mas eu estava falando era da TPM. À medida em que a data da viagem se aproxima, ela aumenta. Checar todas as minhas coisas, separar o que levar, o que vai ficar e o que vou jogar fora... não é uma tarefa fácil. Tanto papel inútil que eu juntei (imagine só, eu tinha guardado o meu primeiro talão de cheques, de 1980!) que só olhar já me deixa cansado. E tem mais: separar CDs, DVDs, roupas, livros, fotos... tudo o que eu juntei nesses 46 anos... e fazer com que tudo caiba em apenas duas malas? É ou não é pra ficar com TPM?
O tempo é curto e há tanta coisa por fazer que não há como não ficar nervoso. Será que vai dar tempo de fazer tudo? Será que não vou esquecer de alguma coisa importante? E quando chegar lá?
Como vão ser os primeiros dias? Vou conseguir entender o francês “québecois”? E a ansiedade para escolher o melhor bairro para morar? Tem parque perto? E estação de metrô? Há alguma boa creche onde possa matricular meu filho? E como vai ser quando o tempo esfriar, daqui a alguns meses? Como vai ser quando fizer -20ºC? Só de pensar já sinto o frio: bem na barriga.
TPM é assim. Faz até a gente deixar de escrever. Ou escrever e achar que está horrível. Ou ainda pior: levar semanas pra escrever uma simples crônica e ainda assim não conseguir explicar direito o que é a tal tensão pré-Montreal. Quando ela passar, talvez eu consiga. Por enquanto vou tratar de combater a danada passando esses dias com a família e com os amigos. ;)
À bientôt, mes amis!
P.S.: Só pra constar: faltam
5 comentários:
Everything is gonna be all right! ;)
Sou aluna de Vilton e ele falou de vcs. Vou acompanhar, e se possível, dar apoio moral a vcs. Para mim e minha família, se tudo dert certo, faltam + de 365 dias.
É isso aí Felipe! Bola pra frente. Coragem... É a única maneira de se combater a danada da TPM. E, acredito, que vocês têm de sobra! Não é por acaso que conseguiram o CSQ. Lembre-se sempre que ao começar um caminho você deixa pegadas pra quem lhe segue. É sempre muito importante pra quem está iniciando o processo, como eu e minha esposa, ler crônicas como a sua. Talvez isso também possa reduzir a TPM. Agora tenho uma boa notícia pra você: essa sua Tensão Pré-Mens... (Ops!) Montréal não virá todo mês!!!
Oi pessoal,
aki é Maria Alice (aluna de Vilton). Fiz um blog tb. Agora fica + fácil nos comunicarmos.
Acho que todo mundo que emigra passa por isso; a gente fica se perguntando se é isso mesmo que deveríamos fazer; se não vamos quebrar a cara quando chegarmos ao destino; se a saudade não vai ser tão arrebatadora que vai forçar a gente a voltar; e tudo o mais...
Mas quando a gente chega lá no destino, se estabelece e começa a entrar na rotina, vê que tudo valeu a pena. E que faríamos tudo de novo se necessário. No final a gente nem pensa em trocar de volta!
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